terça-feira, 31 de dezembro de 2024

sexta-feira, 27 de dezembro de 2024

Intro

O Grande Israel e o Mashiach vitorioso

Uma mudança fundamental está a ocorrer em todo o mundo na imagem de Israel e, talvez também, entre os próprios judeus. Os judeus da Europa despertaram sentimentos de piedade, simpatia e compaixão após a catástrofe que experimentaram sob Hitler durante a Segunda Guerra Mundial. Foi isto que tornou possível a criação do Estado de Israel. 


O Holocausto ou shoah, isto é, os horrores e as perseguições sofridas pelos judeus, tornou-se a base do acordo unânime: depois de tanto sofrimento, os judeus simplesmente tinham o direito de criar o seu próprio Estado. Este tornou-se o capital moral dos judeus e definiu uma atitude sagrada em relação ao Holocausto.

terça-feira, 24 de dezembro de 2024

sábado, 21 de dezembro de 2024

sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

Marcela Magalhães: Os imigrantes e refugiados são o ponto de corte de nossa era

 Os imigrantes e refugiados são o ponto de corte de nossa era, a linha que atravessa o nosso momento histórico e nos interpela em todas as direções. 

2) Se estudarmos o crescimento da ext-direita, vemos que a migração é central na narrativa de ódio deles. Se falamos em colonialismo e neocolonialismo, vê-se que as mesmas estruturas que exploraram e pilharam territórios no passado são as que, hoje, expulsam pessoas de suas terras e as empurram pro desterro.

3) Se a discussão gira em torno da crise de natalidade ou da previdência social, os imigrantes, em vez de serem vistos como parte da solução como o são, são apontados como culpados.

4) Precisa-se cuidar a geração que envelhece, mas ignora-se a centralidade do trabalho de cuidado e de reprodução social, desempenhado principalmente por mulheres migrantes, uma realidade que dialoga diretamente com a atenção do feminismo marxista.

5) Se falamos de uberização do trabalho na Europa, ou de avanço do tecnofeudalismo, ou de neoliberalismo e suas formas mais extremas, ou de ultraliberalismo - não “importa” muito o nome - as novas e velhas fases do sistema continuam a precarizar, dividir e espoliar os trabalhadores imigrantes.

6) Somemos a isso a crise ambiental, que já força deslocamentos em massa, tornando o exílio um fenômeno global. São os primeiros a sentir os efeitos do colapso climático e, ao migrarem, são recebidos com o discurso de que “não há recursos pra todos”.

7) Nos bairros periféricos, onde o abandono do Estado é evidente, a violência policial cai de forma desproporcional sobre corpos racializados e marginalizados de imigrantes. O sistema identifica essas vidas como descartáveis e insiste em empurrá-las pra invisibilidade, exceto quando morrem. Aí são instrumentalizados por populistas.

8) E ainda assim, como perguntei uma vez a Jodi Dean, parece que em muitos países ainda estamos presos à primeira fase das lutas identitárias: um cenário onde grupos de pessoas racializadas continuam lutando contra o Estado por uma igualdade de direitos, mesmo que, na prática, essa igualdade permaneça apenas no papel, tal qual como vimos nas lutas pela abolição da escravatura, onde a “liberdade” não significou justiça material.

9) Não de justiça material talvez, mas o fato é que a regularização de situações e permissões de residência é um ponto inicial. Imprescindível pra dignidade.

10) E, quando um imigrante se move, ele carrega o peso do mundo nas costas e ainda é tratado como culpado. Culpado por “inflacionar o mercado imobiliário”, culpado pela crise social, culpado pela pobreza que ele mesmo NÃO criou.

11) Vale lembrar que a imigração é a face mais visível de uma crise estrutural, onde o capital se move sem fronteiras, mas os seres humanos são barrados, criminalizados e desumanizados.

12) Mas, no capitalismo, o imigrante não é um cliente comum? Ele paga o aluguel mais caro, consome, trabalha e ainda assim é tratado como uma anomalia no mercado, como se o seu simples existir fosse uma ameaça. Enquanto isso, os verdadeiros responsáveis pela especulação (fundos de investimento, especuladores imobiliários e elites financeiras) seguem intocados e lucrando.

13) A ideia de integração, que nos vendem como solução, é igualmente cruel. Não é apenas uma adaptação: é uma fagocitose, um processo de apagamento do passado, da origem, da cultura.

14) Pro imigrante, a integração tem uma exigência perversa: ele precisa provar o seu valor. Tem que ser o “bom imigrante”, aquele que aprende a língua rapidamente, que assimila a cultura local e que, acima de tudo, não incomoda.

15) É a meritocracia do migrante, uma lógica absurda que exige do imigrante um esforço triplo para ser aceito e, ainda assim, ele talvez jamais será suficiente. Porque o problema não é ele: o problema é o sistema que constrói muros invisíveis, alimenta preconceito e nega direitos básicos.

16) A verdade que temos é um sistema que lucra com o imigrante (mas que o despreza), que exige sua integração, mas nunca o aceita por completo. Que culpa o pobre pela pobreza e o exilado pela destruição ambiental, mas não vê que a vinda deles é consequência e não causa de um colapso. O problema não é o imigrante.

17) o Imigrante é sempre um bode expiatório. Ele paga o preço mais alto, seja pelo mercado imobiliário, pelo colapso climático ou pelas crises sociais. É ele que trabalha nos empregos mais precarizados, que sustenta as economias locais, que rejuvenesce a força de trabalho. Mas, em vez de ser reconhecido, ele é vilanizado.


Framboises

Fellini Félin - Come To The Fore (C Duncan Remix)

sábado, 14 de dezembro de 2024

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

sábado, 7 de dezembro de 2024

quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

sábado, 30 de novembro de 2024

Manifesto portugal

 Somos um país feudal, racista, machista, fascista e colonialista.

Apoiamos o genocídio na Palestina e no Líbano, barcos com carregamentos de armas têm porto seguro


em Portugal, o nosso governo apoia Israel, a união europeia apoia Israel. Somos cúmplices de homicídio em massa do povo palestino. 


Quando Netanyahu tiver a morte que merece, Portugal fará 3 dias de luto, como fez a Adolf Hitler.

quinta-feira, 28 de novembro de 2024

A ESCRITA DO DEUS, por Jorge Luís Borges


O cárcere é profundo e de pedra; sua forma, a de um hemisfério quase perfeito,

embora o piso (também de pedra) seja algo menor que um círculo máximo, fato que de

algum modo agrava os sentimentos de opressão e de grandeza. Um muro corta-o pelo

meio; este, apesar de altíssimo, não toca a parte superior da abóbada; de um lado estou eu,

Tzinacan, mago da pirâmide de Qaholom, que Pedro de Alvarado incendiou; do outro há

um jaguar, que mede com secretos passos iguais o tempo e o espaço do cativeiro. Ao nível

do chão, uma ampla janela com barrotes corta o muro central. Na hora sem sombra [o

meio-dia], abre-se um alçapão no alto e um carcereiro que foram apagando os anos

manobra uma roldana de ferro e nos baixa, na ponta de um cordel, cântaros com água e

pedaços de carne. A luz entra na abóbada; nesse instante posso ver o jaguar.


Perdi o número dos anos que estou na treva; eu, que uma vez fui jovem e podia

caminhar por esta prisão, não faço outra coisa senão aguardar, na postura de minha morte,

o fim que me destinam os deuses. Com a profunda faca de pedernal abri o peito das

vítimas e agora não poderia, sem magia, levantar-me do pó.

Na véspera do incêndio da Pirâmide, os homens que desceram de altos cavalos me

castigaram com metais ardentes para que revelasse o lugar de um tesouro escondido.

Abateram, diante de meus olhos, o ídolo do deus, mas este não me abandonou e me

mantive silencioso entre os tormentos. Laceraram-me, quebraram-me, deformaram-me e

depois acordei neste cárcere, que não mais deixarei em minha vida mortal.


Premido pela fatalidade de fazer algo, de povoar de algum modo o tempo, quis

recordar, em minha sombra, tudo o que sabia. Noites inteiras desperdicei em recordar a

ordem e o número de algumas serpentes de pedra ou a forma de uma árvore medicinal.

Assim fui debelando os anos, assim fui entrando na posse do que já era meu. Uma noite,

senti que me aproximava de uma lembrança precisa; antes de ver o mar, o viajante sente

uma agitação no sangue. Horas depois, comecei a avistar a lembrança; era uma das

tradições do deus. Este, prevendo que no fim dos tempos ocorreriam muitas desventuras e

ruínas, escreveu no primeiro dia da Criação uma sentença mágica, capaz de conjurar esses

males. Escreveu-a de maneira que chegasse às mais distantes gerações e que não a tocasse

o azar. Ninguém sabe em que ponto a escreveu nem com que caracteres, mas consta-nos

que perdura, secreta, e que a lerá um eleito. 

Considerei que estávamos, como sempre, no

fim dos tempos e que meu destino de último sacerdote do deus me daria acesso ao

privilégio de intuir essa escrita. O fato de que me rodeasse uma prisão não me vedava essa

esperança; talvez eu tivesse visto milhares de vezes a inscrição de Qaholom e só me

faltasse entendê-la.


Essa reflexão me animou e logo me infundiu uma espécie de vertigem. No âmbito

da terra existem formas antigas, formas incorruptíveis e eternas; qualquer uma delas podia

ser o símbolo procurado. Uma montanha podia ser a palavra do deus, ou um rio ou o

império ou a configuração dos astros. Mas no curso dos séculos as montanhas se aplainam

e o caminho de um rio costuma desviar-se e os impérios conhecem mutações e estragos e a

figura dos astros varia. No firmamento há mudança. A montanha e a estrela são indivíduos

e os indivíduos caducam. Procurei algo mais tenaz, mais invulnerável. Pensei nas gerações

dos cereais, dos pastos, dos pássaros, dos homens. Talvez em minha face estivesse escrita

a magia, talvez eu mesmo fosse o fim de minha procura. Estava nesse afã quando recordei

que o jaguar era um dos atributos do deus.


Então minha alma se encheu de piedade. Imaginei a primeira manhã do tempo,

imaginei meu deus confiando a mensagem à pele viva dos jaguares, que se amariam e se

gerariam eternamente, em cavernas, em canaviais, em ilhas, para que os últimos homens a

recebessem. Imaginei essa rede de tigres, esse quente labirinto de tigres, causando horror

aos prados e aos rebanhos para conservar um desenho. Na outra cela havia um jaguar; em

sua proximidade percebi uma confirmação de minha conjetura e um secreto favor.


Dediquei longos anos a aprender a ordem e a configuração das manchas. Cada cega

jornada me concedia um instante de luz, e assim pude fixar na mente as negras formas que

riscavam a pelagem amarela. Algumas incluíam pontos; outras formavam raias

transversais na face interior das pernas; outras, anulares, se repetiam. Talvez fossem um

mesmo som ou uma mesma palavra. Muitas tinham bordas vermelhas.

Não falarei das fadigas de meu labor. Mais de uma vez gritei à abóbada que era

impossível decifrar aquele texto. Gradualmente, o enigma concreto que me atarefava me

inquietou menos que o enigma genérico de uma sentença escrita por um deus. Que tipo de

sentença (perguntei-me) construirá uma mente absoluta? Considerei que mesmo nas

linguagens humanas não existe proposição que não implique o universo inteiro; dizer o

tigre é dizer os tigres que o geraram, os cervos e tartarugas que ele devorou, o pasto de que

se alimentaram os cervos, a terra que foi mãe do pasto, o céu que deu luz à terra.


Considerei que na linguagem de um deus toda palavra enunciaria essa infinita

concatenação dos fatos, e não de um modo implícito, mas explícito, e não de um modo

progressivo, mas imediato. Com o tempo, a noção de uma sentença divina pareceu-me

pueril ou blasfematória. Um deus, refleti, só deve dizer uma palavra e nessa palavra a

plenitude. Nenhuma palavra articulada por ele pode ser inferior ao universo ou menos que

a soma do tempo. Sombras ou simulacros dessa palavra, que equivale a uma linguagem e a

quanto pode compreender uma linguagem, são as ambiciosas e pobres palavras humanas,

tudo, mundo, universo.


Um dia ou uma noite – entre meus dias e minhas noites que diferença existe? –

sonhei que no chão do cárcere havia um grão de areia. Voltei a dormir, indiferente; sonhei

que despertava e que havia dois grãos de areia. Voltei a dormir; sonhei que os grãos de

areia eram três. Foram, assim, multiplicando-se até encher o cárcere e eu morria sob esse

hemisfério de areia. Compreendi que estava sonhando; com enorme esforço, despertei. O

despertar foi inútil; a inumerável areia me sufocava. Alguém me disse: "Não despertaste

para a vigília, mas para um sonho anterior. Esse sonho está dentro de outro, e assim até o

infinito, que é o número dos grãos de areia. O caminho que terás de desandar é

interminável e morrerás antes de haver despertado realmente".

Senti-me perdido. A areia me enchia a boca, mas gritei: "Nenhuma areia sonhada

pode matar-me, nem existem sonhos dentro de sonhos". Um resplendor me despertou. Na

treva superior desenhava-se um círculo de luz. Vi a face e as mãos do carcereiro, a

roldana, o cordel, a carne e os cântaros.


Um homem se confunde, gradualmente, com a forma de seu destino; um homem é,

afinal, suas circunstâncias. Mais que um decifrador ou um vingador, mais que um

sacerdote do deus, eu era um encarcerado. Do incansável labirinto de sonhos regressei,

como à minha casa, à dura prisão. Bendisse sua umidade, bendisse seu tigre, bendisse a

fresta de luz, bendisse meu velho corpo dolorido, bendisse a treva e a pedra.


Então ocorreu o que não posso esquecer nem comunicar. Ocorreu a união com a

divindade, com o universo (não sei se estas palavras diferem). O êxtase não repete seus

símbolos; há quem tenha visto Deus num resplendor, há quem o tenha percebido numa

espada ou nos círculos de uma rosa. Eu vi uma Roda altíssima, que não estava diante de

meus olhos, nem atrás, nem nos lados, mas em todas as partes, a um só tempo. Essa Roda

estava feita de água, mas também de fogo, e era (embora se visse a borda) infinita.


Entretecidas, formavam-na todas as coisas que serão, que são e que foram, e eu era um fio

dessa trama total, e Pedro de Alvarado, que me atormentou, era outro. Ali estavam as

causas e os efeitos e me bastava ver essa Roda para entender tudo, interminavelmente. Oh,

felicidade de entender, maior que a de imaginar ou que a de sentir! Vi o universo e vi os

íntimos desígnios do universo. Vi as origens que narra o Livro do Comum. Vi as

montanhas que surgiram da água, vi os primeiros homens feitos de pau, vi as tinalhas que

se voltaram contra os homens, vi os cães que lhes destroçaram os rostos. Vi o deus sem

face que há por trás dos deuses. Vi infinitos processos que formavam uma só felicidade e,

entendendo tudo, consegui também entender a escrita do tigre.


É uma fórmula de catorze palavras casuais (que parecem casuais) e me bastaria

dizê-la em voz alta para ser Todo-Poderoso. Bastaria dizê-la para abolir este cárcere de

pedra, para que o dia entrasse em minha noite, para ser jovem, para ser imortal, para que o

tigre destroçasse Alvarado, para afundar o santo punhal em peitos espanhóis, para

reconstruir a pirâmide, para reconstruir o império. Quarenta sílabas, catorze palavras, e eu,

Tzinacan, regeria as terras que Montezuma regeu. Mas eu sei que nunca direi essas

palavras, porque não me lembro de Tzinacan.


Que morra comigo o mistério que está escrito nos tigres. Quem entreviu o universo,

quem entreviu os ardentes desígnios do universo não pode pensar num homem, em suas

triviais venturas ou desventuras, mesmo que esse homem seja ele. Esse homem foi ele e

agora não lhe importa. Que lhe importa a sorte daquele outro, que lhe importa a nação

daquele outro, se ele agora é ninguém. Por isso não pronuncio a fórmula, por isso deixo

que os dias me esqueçam, deitado na escuridão.


Para Ema Risso Platero.

 

AMENRA "Le Cercle"

Julie Christmas - 'The Ash'

terça-feira, 26 de novembro de 2024

domingo, 24 de novembro de 2024

sábado, 23 de novembro de 2024

Auto-imolação na Prisão Estatal de Red Onion

 Caros amigos,


No dia 15 de setembro de 2024, um acontecimento trágico e horrível teve lugar na Prisão Estatal de Red Onion, na Virgínia - um acontecimento que põe em evidência as condições insuportáveis que os indivíduos encarcerados enfrentam todos os dias. Num ensaio radiofónico recente, Kevin Rashid Johnson relata que Econ e o seu companheiro de cela Trayvon Brown se incendiaram, na esperança de escapar ao racismo intolerável, aos abusos e às condições desumanas a que estavam sujeitos. Econ sofreu queimaduras de terceiro grau; os ferimentos do seu companheiro de cela foram ainda piores.


Não se trata de actos isolados. Num espaço de apenas duas semanas, uma dúzia de homens negros da Red Onion tomaram as mesmas medidas desesperadas, incendiando-se a si próprios. Não se trata de actos de protesto. São seres humanos levados a extremos, simplesmente na esperança de obter alívio para o seu tormento.



Kevin Rashid Johnson, um ativista revolucionário encarcerado em Red Onion, relatou estes incidentes horríveis, expondo a crueldade extrema e a falta de esperança que definem a vida dentro da prisão. Rashid não é alheio às injustiças do sistema. Nascido a 3 de outubro de 1971, em Richmond, Virgínia, Kevin “Rashid” Johnson é membro fundador do Partido dos Novos Panteras Negras Afrikan e, mais tarde, do Partido Revolucionário Intercomunitário dos Panteras Negras. Passou décadas a lutar pelos direitos dos indivíduos encarcerados, ao mesmo tempo que passava a vida atrás das grades, depois de ter sido condenado por homicídio em 1990 - um crime que afirma não ter cometido.


A Prison Radio é a plataforma que torna possível que a voz de Rashid - e as vozes de inúmeros outros presos no sistema prisional americano - seja ouvida. Sem o seu apoio, histórias como as de Rashid e Econ permaneceriam enterradas atrás da cortina de ferro da prisão. Na Prison Radio, gravamos e distribuímos testemunhos de indivíduos encarcerados para expor as condições desumanas e exigir responsabilidades. A vossa escuta ativa, a vossa ação de protesto contra estas condições e o vosso apoio ao nosso trabalho permitem-nos manter estas linhas de comunicação abertas.




Em solidariedade,


Tommy Phan


Traduzido com a versão gratuita do tradutor - DeepL.com

quinta-feira, 21 de novembro de 2024

quarta-feira, 20 de novembro de 2024

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

sexta-feira, 15 de novembro de 2024

quinta-feira, 14 de novembro de 2024

quarta-feira, 13 de novembro de 2024

segunda-feira, 11 de novembro de 2024

quinta-feira, 7 de novembro de 2024

quarta-feira, 6 de novembro de 2024

Slowly

sexta-feira, 1 de novembro de 2024

quarta-feira, 30 de outubro de 2024

terça-feira, 29 de outubro de 2024

“Nenhuma propaganda na Terra pode esconder a ferida que é a Palestina" – Arundhathi Roy

 


A escritora e ativista Arundhati Roy foi galardoada com o PEN Pinter Prize 2024, um prémio anual instituído pela PEN inglesa em memória do dramaturgo Harold Pinter. Pouco após ter sido nomeada para o prémio, Arundhati Roy anunciou que a sua parte do dinheiro do prémio seria doada ao Fundo de Ajuda às Crianças Palestinas. Nomeou o escritor e ativista britânico-egípcio Alaa Abd El-Fattah como Escritor de Coragem, com quem partilharia o prémio. Segue-se a transcrição completa do seu discurso de aceitação do prémio, proferido na noite de 10 de outubro de 2024, na British Library, em Londres, Inglaterra.

"Agradeço-vos, membros da PEN inglesa e membros do júri, por me honrarem com o Prémio PEN Pinter. Gostaria de começar por anunciar o nome do Escritor de Coragem deste ano, que escolhi para partilhar este prémio.

Os meus cumprimentos para si, Alaa Abd El-Fattah, escritor de coragem e meu colega galardoado. Esperávamos e rezávamos para que fosse libertado em setembro, mas o Governo egípcio decidiu que era um escritor demasiado belo e um pensador demasiado perigoso para ser libertado. Mas está aqui, nesta sala, connosco. És a pessoa mais importante aqui. Da prisão, escreveu:   “As minhas palavras perderam qualquer poder e, no entanto, continuaram a sair de mim. Eu ainda tinha uma voz, mesmo que só uma mão-cheia me ouvisse.” Estamos a ouvir, Alaa. Com atenção.

Saudações para si também, minha querida Naomi Klein, amiga tanto de Alaa como de mim. Obrigado por estares aqui esta noite. Significa muito para mim.

Saudações a todos vós aqui reunidos, bem como àqueles que são talvez invisíveis para este maravilhoso público, mas tão visíveis para mim como para qualquer outra pessoa nesta sala. Falo dos meus amigos e camaradas na prisão na Índia – advogados, académicos, estudantes, jornalistas – Umar Khalid, Gulfisha Fatima, Khalid Saifi, Sharjeel Imam, Rona Wilson, Surendra Gadling, Mahesh Raut. Dirijo-me a si, meu amigo Khurram Parvaiz, uma das pessoas mais notáveis que conheço, que está na prisão há três anos, e também a si, Irfan Mehraj, e aos milhares de pessoas encarceradas em Caxemira e em todo o país, cujas vidas foram devastadas.

Quando Ruth Borthwick, presidente do English PEN e do júri do Pinter, me escreveu pela primeira vez sobre esta honra, disse que o Prémio Pinter é atribuído a um escritor que tenha procurado definir “a verdade real das nossas vidas e das nossas sociedades” através de uma “determinação intelectual resoluta, inabalável e feroz”. Esta é uma citação do discurso de aceitação do Prémio Nobel de Harold Pinter.

A palavra “inabalável” fez-me parar por um momento, porque me considero uma pessoa que está quase permanentemente a vacilar.

Gostaria de me debruçar um pouco sobre o tema do “hesitar” e do “não hesitar”. Que talvez seja melhor ilustrado pelo próprio Harold Pinter:

Estava presente numa reunião na embaixada dos Estados Unidos em Londres, no final da década de 1980.

O Congresso dos Estados Unidos estava prestes a decidir se daria mais dinheiro aos Contras na sua campanha contra o Estado da Nicarágua. Eu fazia parte de uma delegação que falava em nome da Nicarágua, mas o membro mais importante dessa delegação era o Padre John Metcalf. O chefe da delegação americana era Raymond Seitz (então número dois do embaixador, mais tarde embaixador ele próprio). O Padre Metcalf disse: "Senhor, sou responsável por uma paróquia no norte da Nicarágua. Os meus paroquianos construíram uma escola, um centro de saúde, um centro cultural. Temos vivido em paz. Há alguns meses, uma força contra atacou a paróquia. Destruíram tudo:   a escola, o centro de saúde, o centro cultural. Violaram enfermeiras e professores, mataram médicos, da forma mais brutal. Comportaram-se como selvagens. Por favor, exijam que o governo dos Estados Unidos retire o seu apoio a esta chocante atividade terrorista”.

Raymond Seitz tinha uma óptima reputação como homem racional, responsável e altamente refinado. Era muito respeitado nos círculos diplomáticos. Escutou, fez uma pausa e depois falou com alguma gravidade. “Pai”, disse ele, “deixa-me dizer-te uma coisa. Na guerra, os inocentes sofrem sempre”. Fez-se um silêncio gélido. Ficámos a olhar para ele. Ele não vacilou.

Lembrem-se que o Presidente Reagan chamou aos Contras “o equivalente moral dos nossos Pais Fundadores”. Uma frase de que ele gostava claramente. Também a usou para descrever os Mujahideen afegãos apoiados pela CIA, que depois se transformaram nos Taliban. E são os Taliban que governam atualmente o Afeganistão, depois de terem travado uma guerra de vinte anos contra a invasão e ocupação dos EUA. Antes dos Contras e dos Mujahideen, houve a guerra do Vietname e a doutrina militar americana que ordenava aos seus soldados “matarem tudo o que se mexesse”. Se lermos os Pentagon Papers e outros documentos sobre os objectivos de guerra dos EUA no Vietname, podemos desfrutar de algumas discussões animadas e sem hesitações sobre como cometer genocídio – é melhor matar as pessoas de imediato ou matá-las à fome lentamente? O que é que seria melhor? O problema que os compassivos mandarins do Pentágono enfrentaram foi que, ao contrário dos americanos, que, segundo eles, querem “vida, felicidade, riqueza, poder”, os asiáticos “aceitam estoicamente... a destruição da riqueza e a perda de vidas” – e obrigam a América a levar a sua “lógica estratégica até à sua conclusão, que é o genocídio”. Um fardo terrível a ser suportado sem hesitação.

E aqui estamos nós, todos estes anos depois, mais de um ano após mais um genocídio. O genocídio televisivo, sem hesitação, dos EUA e de Israel em Gaza e agora no Líbano, em defesa de uma ocupação colonial e de um Estado de apartheid. O número de mortos até à data é oficialmente de 42 000, a maioria dos quais são mulheres e crianças. Este número não inclui os que morreram a gritar sob os escombros de edifícios, bairros, cidades inteiras, e aqueles cujos corpos ainda não foram recuperados. Um estudo recente da Oxfam afirma que Israel matou mais crianças em Gaza do que no período equivalente de qualquer outra guerra nos últimos 20 anos.

Para aliviar a sua culpa colectiva pelos seus primeiros anos de indiferença em relação a um genocídio – o extermínio nazi de milhões de judeus europeus – os Estados Unidos e a Europa prepararam o terreno para outro.

Como todos os Estados que levaram a cabo limpezas étnicas e genocídios ao longo da História, os sionistas de Israel – que se consideram “o povo escolhido” – começaram por desumanizar os palestinos antes de os expulsarem das suas terras e de os assassinarem.

O Primeiro-Ministro Menachem Begin chamou aos palestinos " bestas de duas pernas", Yitzhak Rabin chamou-os "gafanhotos" que “podiam ser esmagados” e Golda Meir disse que " os palestinos não existiam". Winston Churchill, esse famoso guerreiro contra o fascismo, disse:   “Não admito que o cão na manjedoura tenha o direito final à manjedoura, mesmo que esteja lá deitado há muito tempo” e a seguir declarou que uma “raça superior” tinha o direito final à manjedoura. Uma vez que essas bestas de duas pernas, gafanhotos, cães e pessoas inexistentes foram assassinadas, etnicamente limpas e guetizadas, nasceu um novo país. Foi celebrado como uma “terra sem povo para um povo sem terra”. O Estado de Israel, dotado de armas nucleares, deveria servir de posto militar avançado e de porta de entrada para as riquezas naturais e os recursos do Médio Oriente para os EUA e a Europa. Uma bela coincidência de objectivos e finalidades.

O novo Estado foi apoiado sem hesitação e com firmeza, armado e financiado, mimado e aplaudido, independentemente dos crimes que cometesse. Cresceu como uma criança protegida numa casa rica, cujos pais sorriam orgulhosos enquanto ela cometia atrocidade atrás de atrocidade. Não admira que hoje se sinta à vontade para se gabar abertamente de ter cometido um genocídio (pelo menos os Documentos do Pentágono eram secretos. Tiveram de ser roubados e divulgados). Não é de admirar que os soldados israelenses pareçam ter perdido todo o sentido de decência. Não é de admirar que inundem as redes sociais com vídeos depravados em que aparecem vestidos com a lingerie das mulheres que mataram ou deslocaram, vídeos em que imitam palestinos moribundos e crianças feridas ou prisioneiros violados e torturados, imagens em que explodem edifícios enquanto fumam cigarros ou ouvem música nos auscultadores. Quem são estas pessoas?

O que pode justificar o que Israel está a fazer?

A resposta, segundo Israel e os seus aliados, bem como os meios de comunicação social ocidentais, é o ataque do Hamas a Israel em 7 de outubro do ano passado. O assassínio de civis israelenses e a tomada de reféns israelenses. Segundo eles, a história só começou há um ano atrás.

Assim, esta é a parte do meu discurso em que se espera que eu me equivoque a fim de proteger a minha “neutralidade”, a minha posição intelectual. É nesta parte que devo cair na equivalência moral e condenar o Hamas, os outros grupos militantes em Gaza e o seu aliado Hezbollah, no Líbano, por matarem civis e fazerem pessoas reféns. E condenar o povo de Gaza que celebrou o ataque do Hamas. Uma vez feito isso, tudo se torna fácil, não é? Ah, bem. Toda a gente é terrível, o que é que se pode fazer? Vamos antes às compras.

Recuso-me a jogar o jogo da condenação. Deixem-me ser clara. Não digo às pessoas oprimidas como devem resistir à sua opressão ou quem devem ser os seus aliados.

Quando o Presidente dos EUA, Joe Biden, se reuniu com o Primeiro-Ministro Benjamin Netanyahu e com o gabinete de guerra israelense durante uma visita a Israel em outubro de 2023, disse:   “Não acredito que seja necessário ser judeu para ser sionista e eu sou sionista”.

Ao contrário do Presidente Joe Biden, que se considera um sionista não judeu e que financia e arma Israel sem hesitar enquanto este comete os seus crimes de guerra, não me vou declarar nem definir de uma forma mais restrita do que a minha escrita. Eu sou o que escrevo.

Tenho plena consciência de que, sendo a escritora que sou, a não muçulmana que sou e a mulher que sou, seria muito difícil, talvez impossível, para mim sobreviver muito tempo sob o domínio do Hamas, do Hezbollah ou do regime iraniano. Mas não é esse o objetivo aqui. O objetivo é educarmo-nos sobre a história e as circunstâncias em que eles surgiram. A questão é que, neste momento, estão a lutar contra um genocídio em curso. O objetivo é perguntarmo-nos se uma força de combate liberal e secular pode fazer frente a uma máquina de guerra genocida. Porque, quando todos os poderes do mundo estão contra eles, a quem é que têm de recorrer senão a Deus? Estou ciente de que o Hezbollah e o regime iraniano têm detractores vocais nos seus próprios países, alguns dos quais também definham nas prisões ou enfrentaram resultados muito piores. Estou ciente de que algumas das suas acções – o assassinato de civis e a tomada de reféns em 7 de outubro pelo Hamas – constituem crimes de guerra. No entanto, não pode haver uma equivalência entre isto e o que Israel e os Estados Unidos estão a fazer em Gaza, na Cisjordânia e agora no Líbano. A raiz de toda a violência, incluindo a violência de 7 de outubro, é a ocupação de terras palestinas por Israel e a sua subjugação do povo palestino. A História não começou em 7 de outubro de 2023.

Pergunto-vos, qual de nós, sentados nesta sala, se submeteria de bom grado à indignidade a que os palestinos em Gaza e na Cisjordânia têm sido sujeitos durante décadas? Que meios pacíficos é que o povo palestino não tentou? Que compromisso não aceitaram – para além daquele que os obriga a rastejar de joelhos e a comer terra?

Israel não está a travar uma guerra de autodefesa. Está a travar uma guerra de agressão. Uma guerra para ocupar mais território, para reforçar o seu aparelho de apartheid e para aumentar o seu controlo sobre o povo palestino e a região.

Desde 7 de outubro de 2023, para além das dezenas de milhares de pessoas que matou, Israel deslocou a maioria da população de Gaza, muitas vezes. Bombardeou hospitais. Atacou e matou deliberadamente médicos, trabalhadores humanitários e jornalistas. Toda uma população está a passar fome – procura-se apagar a sua história. Tudo isto é apoiado moral e materialmente pelos governos mais ricos e poderosos do mundo. E pelos seus media. (aqui incluo o meu país, a Índia, que fornece armas a Israel, bem como milhares de trabalhadores). Não há qualquer distância entre estes países e Israel. Só no ano passado, os EUA gastaram 17,9 mil milhões de dólares em ajuda militar a Israel. Portanto, vamos de uma vez por todas dispensar a mentira de que os EUA são um mediador, uma influência restritiva ou, como Alexandria Ocasio-Cortez (considerada extrema esquerda da política dominante dos EUA) disse, “trabalhando incansavelmente para um cessar-fogo”. Uma parte do genocídio não pode ser um mediador.

Nem todo o poder e dinheiro, nem todas as armas e propaganda da Terra podem continuar a esconder a ferida que é a Palestina. A ferida pela qual o mundo inteiro, incluindo Israel, sangra.

Sondagens mostram que a maioria dos cidadãos dos países cujos governos permitem o genocídio israelense deixou claro que não concorda com isso. Assistimos a essas marchas de centenas de milhares de pessoas – incluindo uma jovem geração de judeus que está cansada de ser usada, cansada de que lhe mintam. Quem poderia imaginar que viveríamos para ver o dia em que a polícia alemã prenderia cidadãos judeus por protestarem contra Israel e o sionismo e os acusaria de antissemitismo? Quem poderia imaginar que o Governo dos EUA, ao serviço do Estado israelense, minaria o seu princípio fundamental da liberdade de expressão, proibindo slogans pró-Palestina? A chamada arquitetura moral das democracias ocidentais – com algumas honrosas excepções – tornou-se motivo de chacota no resto do mundo.

Quando Benjamin Netanyahu mostra um mapa do Médio Oriente em que a Palestina foi apagada e Israel se estende do rio ao mar, é aplaudido como um visionário que trabalha para realizar o sonho de uma pátria judaica.

Mas quando os palestinos e os seus apoiantes cantam “Do rio ao mar, a Palestina será livre”, são acusados de apelar explicitamente ao genocídio dos judeus.

Será que o fazem mesmo? Ou será que se trata de uma imaginação doentia que projecta a sua própria escuridão nos outros? Uma imaginação que não pode aceitar a diversidade, não pode aceitar a ideia de viver num país ao lado de outras pessoas, de forma igual, com direitos iguais. Como toda a gente no mundo faz. Um imaginário que não pode dar-se ao luxo de reconhecer que os palestinos querem ser livres, como o é a África do Sul, como o é a Índia, como o são todos os países que se libertaram do jugo do colonialismo. Países que são diversos, profundamente, talvez mesmo fatalmente, imperfeitos, mas livres. Quando os sul-africanos entoavam o seu popular grito de guerra, Amandla! Poder para o povo, estavam a apelar ao genocídio dos brancos? Não, não estavam. Estavam a pedir o desmantelamento do Estado do apartheid. Tal como os palestinos.

A guerra que agora começou será terrível. Mas acabará por desmantelar o apartheid israelense. O mundo inteiro será muito mais seguro para todos – incluindo o povo judeu – e muito mais justo. Será como tirar uma flecha do nosso coração ferido.

Se o governo dos EUA retirasse o seu apoio a Israel, a guerra poderia parar hoje. As hostilidades poderiam terminar neste preciso momento. Os reféns israelenses poderiam ser libertados, os prisioneiros palestinos poderiam ser libertados. As negociações com o Hamas e com os outros intervenientes palestinos, que inevitavelmente se seguirão à guerra, poderiam ter lugar agora e evitar o sofrimento de milhões de pessoas. É triste que a maioria das pessoas considere isto uma proposta ingénua e risível.

Para terminar, permita-me que me refira às suas palavras, Alaa Abd El-Fatah, do seu livro escrito na prisão, You Have Not Yet Been Defeated. Raramente li palavras tão belas sobre o significado da vitória e da derrota – e sobre a necessidade política de olhar honestamente o desespero nos olhos. Raramente vi escritos em que um cidadão se separa do Estado, dos generais e até dos slogans da praça com tanta clareza.

O centro é traição porque nele só há lugar para o general... O centro é traição e eu nunca fui traidor. Eles pensam que nos empurraram de volta para as margens. Não se apercebem de que nunca saímos de lá, apenas nos perdemos por um breve período. Nem as urnas de voto, nem os palácios, nem os ministérios, nem as prisões, nem mesmo as sepulturas são suficientemente grandes para os nossos sonhos. Nunca procurámos o centro porque este não tem lugar, exceto para aqueles que abandonam o sonho. Mesmo a praça não era suficientemente grande para nós, por isso a maior parte das batalhas da revolução aconteceram fora dela, e a maior parte dos heróis ficaram fora da moldura.

À medida que o horror a que estamos a assistir em Gaza, e agora no Líbano, se transforma rapidamente numa guerra regional, os seus verdadeiros heróis permanecem fora da moldura. Mas continuam a lutar porque sabem que um dia, do rio ao mar, a Palestina será livre.

E será.

Mantenham os olhos no vosso calendário. Não no vosso relógio.

É assim que as pessoas – não os generais – que lutam pela sua libertação medem o tempo.

13/Outubro/2024


The One With the Wurlitzer

Par 5

I'm So Tired

Excuse Me

Manuel Freire - Dulcineia

Girl Boy

sábado, 26 de outubro de 2024

Violência policial e racismo estrutural, por Marcela Magalhães

A violência policial contra corpos racializados não é um acidente, não é um “desvio de conduta”, tampouco é só uma questão de “falta de treinamento”. Vamos deixar bem claro: trata-se de uma lógica assassina que opera em função de um sistema insaciável e racista, que se alimenta do sangue dos pobres e dos negros pra se manter intacto. Só nesta semana a polícia matou pessoas negras em Portugal, Brasil e Itália. 

No Brasil, a polícia invade favelas como um exército, executando jovens negros com uma violência cínica, impune, que grita aos quatro ventos: suas vidas não importam. Em Portugal, o racismo estrutural se revela em cada batida, em cada abordagem violenta contra imigrantes africanos, mostrando que a herança colonial está viva, operando nas sombras, mascarada como “cuidado com a ordem pública”.

E na Itália, vemos a mesma lógica hedionda: migrantes do Norte da África são tratados como pestes a serem controladas, eliminadas, tudo em nome de uma “segurança nacional” que é nada menos que a máscara xenófoba do terror de Estado.

Não é um problema de “alguns maus policiais” – essa é a desculpa do opressor pra fugir da verdade. A questão aqui é estrutural. A polícia é treinada pra defender o capitalismo. E o capitalismo define quem vive e quem morre. Aqueles que não se encaixam nos moldes brancos, ricos, "nacionais" e conformados são alvos a serem neutralizados. Por isso, essa repressão se espalha e se replica globalmente.

Cada batida policial nas periferias brasileiras, cada ataque racista em Portugal e cada brutalidade em território europeu contra migrantes são atos de uma violência internacional e planejada que serve ao mesmo objetivo: manter os oprimidos sob o jugo do medo, da vigilância e da morte.

O que estamos vendo é um padrão que transcende fronteiras e idiomas, uma lógica de controle estatal que, por trás de cada disparo, abuso e batida policial, esconde a premissa de que certos grupos – racializados, empobrecidos, estrangeiros – são descartáveis. Eles representam o "outro" ameaçador, que deve ser vigiado, contido e, se necessário, eliminado.

O capitalismo global constrói esse "outro" como uma ameaça pra justificar a militarização das polícias, o endurecimento das políticas de segurança e, sobretudo, o uso do medo pra manter o controle. Essa violência brutal e sistemática contra pessoas racializadas não é, e nunca foi, meramente um "problema de conduta individual".

Não se trata de "maçãs podres" dentro das forças policiais. Esses são eufemismos deliberados, desenhados pra desviar a atenção das raízes do problema e nos fazer esquecer que a repressão é, de fato, uma função essencial da polícia num sistema capitalista.

Também a desavergonhada invasão de velórios por policiais, nesta mesma semana, tanto no Brasil e quanto em Portugal – dos mesmos agentes que derramaram o sangue das vítimas negras que agora os familiares tentam honrar – ultrapassa qualquer limite de violência imaginável. Não se contentam em tirar a vida, mas em macular a morte e tentar apagar a memória.

No Brasil, onde a polícia já age como um exército opressor nas periferias, com "licença implícita" pra matar jovens negros e pobres, a invasão de velórios expõe o desprezo mais profundo pela dignidade humana. Não basta pro aparato do Estado esmagar esses corpos. Ele precisa também invadir o espaço do último adeus, transformando o luto numa cena de novo terror, assombrando as famílias que já foram mutiladas por suas ações.

Da mesma forma, em Portugal, vemos o mesmo "modus operandi": a polícia, a mesma que assassinou Odair, entra no velório, o espaço de luto, pra atormentar ainda mais os enlutados, como se dissesse "nem na morte vocês terão sossego".

Essas invasões são mensagens sádicas, enviadas pelo Estado a todos que ousam existir à margem do privilégio racial e econômico: "Seus corpos não nos importam, suas vidas não nos importam, e sua dor, muito menos".

Trata-se de um show de força, uma afirmação cruel de poder sobre comunidades negras e racializadas, que sublinha a realidade de que, pro capitalismo racial e seu braço armado, essas vidas são consideradas descartáveis, substituíveis, sujeitas ao desprezo contínuo até mesmo na morte.

Amanhã, manifestações estão convocadas na Itália e em Portugal, não só pra honrar a memória dos que foram assassinados, mas pra lembrar ao Estado e ao mundo que essas vidas são inapagáveis.


Marcela Magalhães






Les Madeleines

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

quarta-feira, 16 de outubro de 2024

quarta-feira, 2 de outubro de 2024

sábado, 28 de setembro de 2024

Rania Khalek Explains Israel's Latest Attacks on Lebanon

Andando pela vida

Em Beirute Sarin @Sarin_nlnl

 Em Beirute

nem o Sol nasce Em Beirute como merece E é mais quente que o ar do deserto É mais fundo que um buraco aberto Na memória de uma terra ainda morna que já não torna a ser Beirute.

Guerrilheiro urbano

E se eu não te amar mais

sábado, 21 de setembro de 2024

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

sexta-feira, 13 de setembro de 2024

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

segunda-feira, 2 de setembro de 2024

domingo, 1 de setembro de 2024

sexta-feira, 30 de agosto de 2024

segunda-feira, 26 de agosto de 2024

sexta-feira, 23 de agosto de 2024

In Limbo

quinta-feira, 22 de agosto de 2024

terça-feira, 20 de agosto de 2024

segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Amore

domingo, 11 de agosto de 2024

Shit Luck

quarta-feira, 7 de agosto de 2024

segunda-feira, 5 de agosto de 2024

terça-feira, 30 de julho de 2024

sexta-feira, 26 de julho de 2024

quinta-feira, 25 de julho de 2024

terça-feira, 16 de julho de 2024

domingo, 14 de julho de 2024

segunda-feira, 8 de julho de 2024

sábado, 6 de julho de 2024

@titsay


 

segunda-feira, 1 de julho de 2024

sábado, 29 de junho de 2024

sexta-feira, 28 de junho de 2024

quarta-feira, 26 de junho de 2024

Lamb Man

sábado, 22 de junho de 2024

sábado, 15 de junho de 2024

segunda-feira, 10 de junho de 2024

Believing

As We Bloom